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A DIGITALIZAÇÃO DO EU NA VIDA COTIDIANA

Foto do escritor: Alexsandro Alves de AraujoAlexsandro Alves de Araujo

Atualizado: 5 de mar.

    Pós-doutor, professor e pesquisador Leonardo Fernandes Nascimento
Pós-doutor, professor e pesquisador Leonardo Fernandes Nascimento

Alexsandro Araujo


AS IMPLICAÇÕES DAS REDES SOCIAIS NA VIDA POLÍTICA


"Como sociólogos, podemos negligenciar o interesse pelo mundo digital, como se ele não tivesse influência no mundo “real”?

A sociologia digital se resume ao mero estudo da “cultura on-line?" Nascimento, L, F. (2020, Pg. 13).


Parafraseando o autor:


  • "Acreditar que estamos fazendo sociologia digital por estudar redes sociais digitais me parece totalmente equivocado."

  • "A sociologia digital não diz respeito somente à especificidade dos objetos que ela pesquisa, nem tampouco em relação ao uso de ferramentas digitais."

  • "O ponto central, na minha opinião, reside nas relações que precisam ser estabelecidas entre os métodos digitais, os dados sociais produzidos pelas tecnologias digitais e o legado das teorias sociológicas que nos foram úteis ao longo do século XX." Nascimento, L, F. (2020, Pg. 13).


As redes sociais digitais se tornaram um elemento fundamental na vida contemporânea, influenciando não apenas as iterações cotidianas, mas também o cenário político em nível global. O ambiente digital proporciona novas formas de articulação, mobilização e debate público, transformando a maneira como as pessoas se relacionam com a política e com as instituições sociais. Ou seja, o mundo digital é real, apesar de não ser físico, tem grande influencias nas decisões sociais, culturais, politicas na realidade material. Este texto tem como objetivo discutir as implicações das redes sociais na vida quotidiana, considerando suas influências sobre a participação cidadã na formação de opinião pública e nos movimentos sociais em um contexto de avanço tecnológico acelerado.

Para compreender essas transformações, é necessário, primeiramente, realizar uma pequena digressão histórica sobre eventos que moldaram a sociedade moderna e que são objetos de estudo da sociologia. A Revolução Industrial, com suas profundas mudanças econômicas e sociais, deu origem à sociologia como uma ciência voltada para a compreensão dos problemas gerados por esse novo modelo de produção e organização social. Posteriormente, a Revolução Tecnológica, impulsionada pela globalização e pelo advento da internet, ampliou as possibilidades de comunicação e permitiu que vozes antes marginalizadas ganhassem espaço no debate público, ressignificando o papel dos meios de comunicação tradicionais.

A sociologia, como método de análise, busca compreender as relações sociais em diferentes momentos históricos, adaptando suas ferramentas teóricas e metodológicas para interpretar os fenômenos emergentes tanto no mundo físico como no virtual. Nesse sentido, a sociologia digital, não é só um é campo de investigação que examina as dinâmicas sociais no espaço virtual, vai além do simples estudo da "cultura on-line".

Como destaca Nascimento (2020, p. 13), não se trata apenas de analisar plataformas digitais, mas de articular métodos digitais, dados sociais produzidos pelas tecnologias e as tradições sociológicas para compreender as transformações sociais em curso.

Dessa forma, este texto propõe na introdução um percurso que parte da análise das mudanças históricas estruturantes - a Revolução Industrial e a Revolução Tecnológica - para, em seguida, discutir o papel da sociologia como método de compreensão dos fenômenos sociais e, explorar as especificidades da sociologia digital, e por fim, explanar sobre a polarização das bolhas de informação e a propagação de fake News por meio das redes sociais na política brasileira.


A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL


Revolução industrial
Fábrica no período da revolução industrial

Com a revolução industrial, começaram a surgir vários problemas de desigualdade econômica e social, fome, má distribuição de renda, problemas relacionados aos novos modos de trabalho e ainda de classes.

Este cenário emergente de problemas e mudanças nas configurações geográficas e demográficas em torno dos grandes centros urbanos configurou e contribuiu para o desbravamento da sociologia como ciência social para entender e interpretar os problemas da época.


Revolução tecnológica


Imagem de IA sobre a globalização

O contexto da globalização, com o surgimento da Internet e da revolução tecnológica, tornou o mundo numa aldeia global fez com que se tornasse possível a ampliação da voz de grupos minoritários de vários lugares do mundo. Com nesse turbilhão de novidades vieram as redes sociais contribuindo para vários movimentos, como a primavera Árabe, por exemplo. Todo mundo tinha um celular com câmera e a informação não dependia mais dos meios de comunicação formal, como rádio e televisão. Os problemas locais poderiam ser vistos por pessoas do outro lado do mundo. Temos agora outro de revolução, a revolução tecnológica.


Sociologia como método


A sociologia é uma ciência que se utiliza de métodos para analisar contextos e situações sociais de diferentes períodos históricos, políticos, econômicos, religiosos e culturais. Assim como aconteceu na revolução industrial com as mudanças sociais econômicas etc. e na revolução tecnológica com o surgimento da internet e das redes sociais, a sociologia vai analisar os fatos e utilizar de métodos, metodologias, a própria tecnologia para se apropriar dos contextos sociais e por meios do conhecimento sociológico interpretar a realidade.


Sociologia digital


Sociologia digital

A sociologia digital é um campo da sociologia que pretende abordar as configurações sociais, assim como os autores clássicos da sociologia fizeram em suas épocas nos seus contextos sociais. Considerando o espaço digital e suas interações através desse meio como um campo de pesquisa social que pode promover o entendimento e o surgimento de novas teorias sociais. Os autores clássicos analisaram as relações de trabalho, a desigualdade social, a alienação e as teorias de classe. Como as teorias da ação social, fatos sociais, estratificação, burocracia e o contexto da religião e do trabalho em si de suas épocas. Nesse novo contexto, há a necessidade de entendimento e interpretação de vários fenômenos contemporâneos sociais que acontecem por meio desse novo terreno. Ou seja, “A sociologia digital não se resume ao mero estudo da “cultura on-line”. Ela analisa o ethos ou o espírito do tempo por meios de estudos e pesquisas sociais nos meios digitais. Tudo o que está acontecendo agora, no Brasil e no mundo está acontecendo tambem nas redes sociais. Campanhas politicas e políticos se utilizam das redes para se tornarem populares, ganhar seguidores e engajamento. Fazem "passinhos", pintam o cabelo, adotam cachorro ao vivo e chamam o público para dar nome ao animal. Nada disso pode ser negligenciado e passar despercebido como algo virtual que não interfere no mundo real físico.


A PRIMAVERA ÁRABE E AS REDES SOCIAIS


As redes sociais desempenharam um papel significativo na culminância da Primavera Árabe de várias maneiras: as plataformas Facebook, Twitter e YouTube: As redes sociais nos meios digitais permitiram que os ativistas organizassem protestos e coordenasse movimentos de maneira rápida e eficiente como se estivessem próximos uns dos outros. Isso possibilitou que informações sobre os protestos e eventos fossem compartilhadas amplamente em tempo real.

Primavera Árabe

As redes sociais deram voz a pessoas que tradicionalmente não tinham acesso aos meios de comunicação convencionais controlados pelo estado. Isso permitiu que os cidadãos compartilhassem histórias, imagens e vídeos que destacavam abusos de direitos humanos, corrupção e outros problemas sociais, aumentando a conscientização global. As pessoas perceberam que os seus problemas eram parecidos em outros lugares do mundo.

Diferente de estruturas hierárquicas tradicionais, as redes sociais facilitaram a organização horizontal, onde pessoas comuns podiam se conectar diretamente e coordenar ações coletivas e isso pode ter sido o que ajudou na mobilização de grandes grupos de manifestantes em curtos períodos de tempo.

Enquanto a mídia tradicional era muitas vezes controlada ou censurada pelos governos, os cidadãos utilizaram as redes sociais para reportar eventos e compartilhar informações que não eram divulgadas pelos canais convencionais. Isso foi crucial para expor a realidade do que estava acontecendo no terreno.

As imagens e relatos compartilhados nas redes sociais despertaram solidariedade global e apoio internacional para os movimentos da Primavera Árabe. Isso pressionou governos e organizações internacionais a responderem aos eventos que estavam ocorrendo.

Em resumo, as redes sociais não apenas facilitaram a organização e a mobilização dos protestos durante a Primavera Árabe, mas também desempenharam um papel crucial ao amplificar as vozes dos manifestantes, expondo injustiças e mobilizando apoio global.


A POLITICA BRASILEIRA E AS REDES SOCIAIS


A partir de 2016, o momento político no Brasil, marcado pelo impeachment de Dilma Rousseff, a Operação Lava Jato e a polarização crescente entre grupos de direita e esquerda, foram intensamente influenciadas e amplificadas pelas redes sociais. Essas plataformas desempenharam um papel central na intensificação dos embates políticos no país, de várias maneiras:


  1. Polarização e bolhas de informação e a propagação de fake News


Banheiro unissex Fake News

Os algoritmos das redes sociais, como Facebook, Twitter como tambem o uso do WhatsApp, facilitaram a criação de "bolhas de filtro", onde os usuários tendem a se conectar com pessoas que compartilham de suas visões políticas. Isso reforçou a polarização, pois as pessoas se expunham principalmente a conteúdos que confirmavam suas crenças, dificultando o diálogo entre posições opostas.

O ambiente de incerteza política foi terreno fértil para a disseminação de notícias falsas (fake News). A partir de 2016, muitos usuários foram expostos a informações imprecisas ou fabricadas, especialmente em aplicativos como o WhatsApp, que se tornou uma ferramenta central para a disseminação rápida de desinformação. Isso criou percepções distorcidas sobre os eventos políticos e acentuou o antagonismo entre grupos opostos.


  1. Mobilização de movimentos e protestos e as campanhas políticas digitais


Assim como na Primavera Árabe, as redes sociais no Brasil serviram como plataformas para mobilizar protestos e ações coletivas. Movimentos como o "Fora Dilma" ou o "Fora Temer" utilizaram as redes para convocar manifestações em massa, com hashtags específicas sendo disseminadas e organizadas em tempo real. Isso facilitou a coordenação de protestos nacionais, aumentando a participação popular.

Imagem de fora Dilma

A campanha presidencial de 2018, que culminou na eleição de Jair Bolsonaro, foi um exemplo claro de como as redes sociais se tornaram um campo de batalha político. Bolsonaro utilizou intensamente o WhatsApp e outras plataformas para contornar a mídia tradicional e se conectar diretamente com eleitores, gerando um movimento popular online que o ajudou a vencer a eleição. O uso estratégico das redes sociais permitiu que candidatos emergissem como figuras populares sem a necessidade de grande suporte de partidos ou da mídia tradicional.


  1. Amplificação de Narrativas e Ataques


Manuela Dávila

Em 2018 as redes sociais intensificaram os ataques pessoais e as campanhas de difamação, onde figuras públicas e políticas eram alvos de memes, vídeos virais e ataques verbais. Esse tipo de conteúdo, muitas vezes simplificado e emocional, reforçou divisões e inflamou debates, fazendo com que a política se tornasse mais sobre confronto do que diálogo.

Desde 2016, as redes sociais também se tornaram espaços de pressão direta sobre políticos e instituições. O engajamento online, por meio de abaixo-assinados, campanhas virais e hashtags, criou um ambiente em que as decisões políticas eram frequentemente moldadas ou influenciadas pela opinião pública que circulava nessas plataformas.


A RADICALIZAÇÃO DO DISCURSO


As redes sociais permitiram a amplificação de discursos extremistas, tanto à direita quanto à esquerda. Com o algoritmo das plataformas favorecendo conteúdos emocionais e polarizadores, as redes fomentaram uma radicalização dos discursos políticos, o que levou a embates mais acalorados e até violência em alguns casos.

Em resumo, a partir de 2016, as redes sociais no Brasil transformaram-se em arenas de embate político, onde a desinformação, a polarização e a radicalização dos discursos intensificaram a tensão política no país. Isso resultou em um ambiente político extremamente fragmentado, no qual as redes desempenharam um papel central ao moldar narrativas, mobilizar eleitores e criar divisões profundas entre diferentes segmentos da sociedade. Negligenciar os espaços das redes sociais, acreditando que seja só algo virtual e considerar somente o ambiente físico natural como um lugar onde seja capaz de realizar pesquisas e desenvolver teorias sociais é um engano. Achar ridículo que um candidato pinte o cabelo, por aclamação pública feita em forma de desafio numa rede social, não se está percebendo a subjetividade das iterações e o engajamento com os eleitores. Antes o politico tinha que sair de porta em porta, fazer comícios em praça pública, fazer doações às pessoas mais pobres. Hoje o carisma alcançado por meio das redes sociais e os espaços geográficos são bem maiores. O mundo virtual está conectado de forma interdependente com o mundo natural.

 

Nascimento, L, F. (2020). Sociologia digital: uma breve introdução. - Salvador: EDUFBA, 2020.

 

 

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